Para que os serviços de alta qualidade oferecidos pelo setor alcancem um número ainda maior de brasileiros, o respeito às normas estabelecidas e a segurança jurídica são fundamentais.

O balanço da saúde suplementar de 2023, divulgado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), órgão regulador do setor, apresenta dados que podem parecer contraditórios para aqueles que não conhecem o funcionamento do sistema. Pela primeira vez, 51 milhões de brasileiros têm acesso a planos de assistência médica — e, mesmo assim, o setor continua enfrentando um resultado operacional negativo. Desde 2021, as perdas acumuladas ultrapassam R$ 20 bilhões. Isso pode parecer paradoxal, mas não é.

A discrepância entre esses dois dados evidencia que a sustentabilidade do setor de saúde suplementar está em risco. Uma das razões para essa situação é o grande número de desafios técnicos que o setor enfrenta. Entre eles, estão os crescentes gastos com reembolsos fraudulentos, que entre 2019 e 2023, superaram R$ 10 bilhões, segundo estimativas da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).

Outro aspecto importante é o excesso de judicialização indevida. Os dados do Conselho Nacional de Justiça são tão elevados que poderiam parecer exagerados. Infelizmente, não são. Em 2023, mais de 570 mil novas ações relacionadas à saúde foram registradas na Justiça, e 219 mil dessas ações envolvem o setor de saúde suplementar. A judicialização excessiva, muitas vezes movida por comportamentos fraudulentos, representa um sério obstáculo ao Sistema Judiciário, que se vê sobrecarregado com ações sem mérito, baseadas em justificativas infundadas.

O impacto desse cenário é refletido em números alarmantes para a saúde suplementar. Nos últimos cinco anos, os custos com judicialização somaram mais de R$ 15 bilhões. Entre 2017 e 2018, as despesas judiciais das operadoras de planos de saúde aumentaram 11,4%; de 2018 para 2019, o crescimento foi ainda mais acentuado: 19,9%. No entanto, o aumento mais expressivo foi entre 2021 e 2022, atingindo 58,2%. Esses números não são triviais, e a busca por uma solução não pode ser menosprezada. A ação é necessária e urgente, pois a inércia compromete a sustentabilidade do setor e, principalmente, prejudica os beneficiários.
Atualmente, um em cada quatro brasileiros possui plano de saúde. São 677 operadoras de planos médico-hospitalares que, diariamente, realizam 3 milhões de exames (laboratoriais e de imagem), 10 mil cirurgias, 25 mil internações, 4.300 sessões de quimioterapia, entre muitos outros serviços e procedimentos. Anualmente, o total de procedimentos ultrapassa 1,6 bilhão. Os 51 milhões de beneficiários da saúde suplementar no Brasil já superam a população de qualquer país da América Latina, exceto o México.

Apesar dos desafios, ainda há espaço para crescimento no Brasil. O plano de saúde é o terceiro maior desejo de consumo dos brasileiros, atrás apenas de educação e casa própria, conforme pesquisa do Vox Populi encomendada pelo Instituto de Estudos em Saúde Suplementar (IESS). Esse dado é corroborado por um estudo da Abramge, que entrevistou 1.599 pessoas e constatou que 94% delas pagariam pelo benefício se tivessem condições financeiras.

O brasileiro valoriza a segurança que o serviço oferece e espera que o custo seja acessível. Ampliar o acesso da população ao sistema é possível e é um dos objetivos da Abramge. No entanto, para que os serviços de alta qualidade do setor cheguem a um número ainda maior de brasileiros, é necessário que o crescimento seja equilibrado. E, para isso, o respeito às normas estabelecidas e a segurança jurídica são essenciais.

Reconhecemos que há sempre espaço para melhorias, mas é necessário que o debate seja racionalizado. A observância das normas e regulações por parte dos agentes do setor e das instâncias julgadoras é fundamental para garantir um atendimento justo a todos os beneficiários. E isso só será alcançado se, quando comprovadas as fraudes, as medidas punitivas forem aplicadas de maneira rigorosa.

É preciso analisar essa situação com atenção. Por isso, é essencial que os representantes do setor participem do debate e contribuam na busca por uma solução. O grande beneficiário de um debate em que todas as partes são ouvidas será o usuário dos planos de saúde.